Katie Hunt da CNN - 16/06/2022 às 07:42
Lápides em uma região onde hoje é o Quirguistão revelaram detalhes interessantes sobre as origens da Peste Negra ,
o surto de peste mais devastador do mundo que se estima ter matado
metade da população da Europa no espaço de apenas sete anos durante a
Idade Média.
A fonte dessa pandemia
tem sido debatida pelos historiadores há séculos, mas as lápides com
inscrições – algumas das quais se referiam a uma misteriosa pestilência –
e o material genético de corpos exumados de dois túmulos que datam do
século XIII forneceram algumas respostas concretas a esta pergunta de
longa data.
Os pesquisadores primeiro escavaram os locais de
sepultamento na década de 1880. As inscrições da lápide, escritas na
língua siríaca, foram cuidadosamente reexaminadas em 2017 pelo
historiador Phil Slavin, professor associado da Universidade de
Stirling, na Escócia.
Slavin notou que dos 467 enterros que foram datados com precisão, um
número desproporcional – 118 – eram de apenas dois anos: 1338 e 1339.
Uma revelação que ele descreveu como “surpreendente”.
“Quando você
tem um ou dois anos com excesso de mortalidade, isso significa que algo
estava acontecendo. Mas outra coisa que realmente chamou minha atenção é
o fato de que não foi um ano qualquer – porque foi apenas sete ou oito
anos antes que a (praga) realmente chegasse à Europa”, disse Slavin em
entrevista coletiva.
“Sempre fui fascinado pela Peste Negra. E um
dos meus sonhos era realmente poder resolver esse enigma de suas
origens”, acrescentou.
Slavin e seus colaboradores descobriram que
os restos mortais de 30 dos indivíduos enterrados nos túmulos do
Quirguistão foram levados para um museu em São Petersburgo, Rússia. A
equipe de pesquisa conseguiu permissão para extrair DNA dos esqueletos
para entender como estes indivíduos morreram.
Em sete dos
indivíduos, os pesquisadores conseguiram extrair e sequenciar o DNA de
seus dentes. Nesse material genético, encontraram o DNA da bactéria da
peste – que os cientistas chamam de Yersinia pestis – em três dos
indivíduos, todos com o ano de morte 1338 inscrito em suas lápides.
Isso
confirmou que a pestilência mencionada nas lápides era de fato a praga,
que é transmitida de roedores para humanos por meio de pulgas. Em 1347,
a peste entrou pela primeira vez no Mediterrâneo através de navios
comerciais que transportavam mercadorias de territórios ao redor do Mar
Negro.
A doença então se espalhou pela Europa, Oriente Médio e
norte da África, atingindo até 60% da população, de acordo com o estudo
publicado na revista Nature na quarta-feira (15).
Alguns
historiadores acreditam que a praga que causou a Peste Negra se originou
na China, enquanto outros pensam que surgiu perto do Mar Cáspio. A
Índia também foi levantada como uma possível fonte. A cepa da praga
continuou a circular pelo mundo por 500 anos.
Uma das lápides estudades pelos pesquisadores / Profesor Pier-Giorgio Borbone Evolução da cepa O
estudo mais recente acrescenta uma riqueza de informações reveladas
pelo sequenciamento de patógenos antigos, como a peste, que deixam uma
marca genética no DNA humano.
Em 2011, os cientistas sequenciaram
pela primeira vez o genoma da bactéria da peste – Yersina pestis –
encontrada em duas vítimas enterradas em um poço em Londres. Desde
então, mais material genético foi recuperado de túmulos em toda a Europa
e no sul da Rússia.
Este trabalho mostrou uma explosão na
diversidade de cepas de peste que ocorreu na evolução da bactéria em
algum momento antes da Peste Negra devastar a Europa – provavelmente
entre os séculos X e XIV.
Os pesquisadores envolvidos neste último
estudo acreditam que a área ao redor dos dois cemitérios perto do Lago
Issyk-Kul, no Quirguistão, deve ter sido a origem da cepa da peste que
causou a Peste Negra, porque dois genomas antigos que a equipe reuniu a
partir dos dentes revelaram uma única estirpe de peste que é o ancestral
direto mais recente deste evento de evolução. Isso o coloca bem no
início do surto da Peste Negra e antes de chegar à Europa.
“Descobrimos
que as cepas antigas do Quirguistão estão posicionadas exatamente no nó
desse evento de diversificação massivo”, disse a principal autora do
estudo, Maria Spyrou, pesquisadora de pós-doutorado na Universidade de
Tübingen, na Alemanha.
Outras evidências para apoiar a alegação
dos pesquisadores do estudo vieram da comparação de cepas de peste
encontradas em roedores modernos com aquelas sequenciadas nos
cemitérios.
Os cientistas descobriram que as cepas modernas de
peste mais intimamente relacionadas à cepa antiga são hoje encontradas
em roedores selvagens, como marmotas, que vivem nas montanhas Tian Shan,
muito perto dos dois túmulos.
“O que é realmente notável é que
hoje, nos roedores que vivem nessa região, temos os parentes vivos mais
próximos dessa cepa”, disse o autor sênior do estudo Johannes Krause,
diretor do Instituto Max Planck de Antropologia Evolutiva, em Leipzig,
Alemanha.
“Encontramos não apenas o ancestral da Peste Negra, mas,
na verdade, encontramos o ancestral da maioria das cepas de peste que
circulam no mundo hoje”.
Ainda há muito que a equipe não sabe,
como exatamente de qual animal a doença se espalhou para os humanos. Mas
entender a origem da maior pandemia da história da humanidade pode
ajudar a se preparar para futuras repercussões de doenças, disse Krause.
Este conteúdo foi criado originalmente em inglês.
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